sábado, março 08, 2003

Noite alta, céu risonho
Como quando Você fala durante
o sono

Meu pai aponta na árvore o
fruto estranho
O amor universal
Grandes ilusões

Você não morre mais tão cedo
De tanto que eu circunavego
o seu nome

A meia-lua de bandeira turca
O metrô
Grandes ilusões

O filho do filho do filho
do homem
Um tempo pra nós
Grandes ilusões

A quietude é quase um sonho


Outra letra do Fellini: "Grandes Ilusões. Outra de "Amor Louco". Desculpem a insistência, mas esse CD tem rodado com muita frequencia no meu disc-man. Não enjoei e nem vou enjoar, pois a cada audição há sempre um detalhe novo a ser desfrutado.
Na semana passada, eu falei do álbum, agora quero me deter um pouco mais na letra. Há muito tempo neste blog eu venho tecendo elogios rasgados a musicalidade da banda. Porém, ela não serviria de nada sem a poesia de Cadão Volpato. Seu estilo de escrever é totalmente peculiar no rock nacional, creio. Ele não é um contador de histórias como o Renato Russo de "Eduardo e Mônica" e "Faroeste Caboclo". Também não é um desesperado cronista do cotidiano como Cazuza em "Brasil". O grande charme dos textos de Cadão é o de criar imagens aparentemente sem qualquer tipo de conexão em seus versos para que cada ouvinte tire a sua própria conclusão, a sua própria mensagem. "Grandes Ilusões" talvez seja a melhor representação disso. Há uma citação a um clássico da antiga MPB (noite alta/céu risonho) e pelo menos dois versos brilhantes: "Você não morre mais tão cedo/De tanto que eu circunavego/o seu nome" (seria uma declaração de amor?) e "A quietude é quase um sonho".
Não conheço nenhum estudo aprofundado da produção de Cadão Volpato como letrista no Fellini. Por tudo o que eu já disse, valeria a pena que algum mestrando ou doutorando da cadeira de Letras se debruçasse nelas. Porém, creio que muita gente prefira trabalhar com autores já consagrados, exemplos dos citados Renato Russo e Cazuza. Uma coisa é certa: mesmo com o intervalo de quase dez anos entre o lançamento de "Amor Louco" o recente "Amanhã é Tarde", a qualidade das letras continua a mesma. Pode ser uma das vantagens do Fellini ser uma banda bissexta, mas eu aposto que é muito mais por causa do talento natural de Cadão.
Há mais um dado curioso sobre a belíssima "Grandes Ilusões". Em "Amor Louco, ela figura como uma balada com muitos violões e um teclado, mas existe uma outra versão com andamento mais rápido e uma letra totalmente diferente. Seu título é "Por Toda Parte" e nunca chegou a ser gravada, apenas tocada pela banda em apresentações ao vivo. Thomas Pappon, a outra alma do Fellini, achou-a tão maravilhosa que resolveu fazer uma versão em inglês, cujo título é "Everywhere". Está em "Eurosambas", primeiro CD do The Gilbertos, projeto-solo de Thomas. Qualquer dia desses eu coloco sua letra aqui.
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