sábado, dezembro 07, 2002

Fui assaltado duas vezes na vida. A primeira foi em 1990. Eu estava na esquina da Al. Barão de Limeira com a Duque de Caxias (aqui em São Paulo) esperando o sinal fechar, isso lá pelas onze da noite. Dois adolescentes bem vestidos, diga-se de passagem, me surpreenderam e anunciaram o assalto. É claro que eles foram direto na minha carteira, mas não deram sorte, pois naquele dia eu estava sem dinheiro. Bem, alguma coisa a dupla tinha que levar, então fiquei sem um guarda-chuva velho e uma jaqueta que tinha acabado de comprar e ainda estava pagando num crediário. No mais, não sofri nenhuma violência físice e ficou apenas o susto.
A segunda vez aconteceu nesse sábado. Eu estava na Praça Princesa Isabel esperando o ônibus que me levaria para casa após mais um dia normal de trabalho. Chovia naquele momento e decidi me proteger ficando embaixo de uma marquise do outro lado da rua, bem próximo. Veio do meu lado um garoto com um carrinho no qual ele vendia picolés com o mesmo intuito. Pouco depois, chega mais uma pessoa. Era um rapaz de bermuda, camiseta regata e com um dos pés de chinelo na mão. Ele perguntou se eu tinha uma tesoura. Respondi que não. Então ele veio com aquela velha história: queria saber se eu tinha cinquenta centavos para dar a ele. Minha resposta foi negativa. O rapaz pediu para ver minha carteira e a partir daí, deu para perceber o que ele realmente queria. O garoto do carrinho de picolés, percebendo o que estava acontecendo, deu no pé. Coube a mim a tarefa de me virar com o cara que primeiro queria uma tesoura e depois cinquenta centavos. Agora já posso chama-lo de marginal. Na sequencia ele colocou a mão no meu bolso querendo a carteira. Esbocei uma pequena reação, pois percebi que ele não estava armado. Tentei impedir que ele levasse o que desejava, mas minha calça acabou rasgando no bolso e facilitou a sua intenção. Houve um esboço de perseguição. Corri o mais que pude, mas sabe quando uma coisa te faz parar? Desisti. Sabe lá Deus o que poderia acontecer se eu conseguisse alcançar o ladrão.
Levei um pequeno prejuízo, é verdade. Fiquei sem meu crachá de acesso da empresa onde trabalho atualmente. Meu cartão-lanche já era também. Quanto aos documentos, nem me preocupo, pois sempre andei com cópias autenticadas deles (alías, recomendo que todos façam o mesmo; nunca se sabe o que pode acontecer). Tinha algum dinheiro e uns passes de ônibus, mas isso não significa muito. O que mais me indgina nesse caso é a omissão das pessoas. No ponto do ônibus, que estava bem próximo de onde tudo aconteceu, tinha um casal. Eles viram o que se passou e nenhum deles ao menos gritou um básico: "pega ladrão". O que dizer então do garoto do carrinho de sorvetes?
Perto de onde fica esse ponto de ônibus tem uma igreja Batista e com alguns seguranças que ficam olhando os veículos dos fiéis que vão assitir aos cultos. Custava alguém ter avisado? Depois de que eu desisti da perseguição, voltei lá para o ponto e esculachei o casal. Desejei de coração que eles nunca fossem assaltados ao esperar o ônibus e agradeci pela omissão. Peguei mais pesado com o vendedor de sorvetes. Na hora da raiva disse que ele era comparsa do sujeito que tinha me roubado, mas creio que não tinha nada a ver com a história. Deveria ser um trabalhdor como eu.
Enfim, é nessas horas que a gente percebe a solidariedade humana (e principalmente, a falta da mesma). Depois do esculacho o casal foi embora. Os vi fazendo uma ligação num orelhão e tomaram o rumo da Av. Rio Branco. Não dirigiram uma palavra a mim, nem mesmo quando dei a bronca neles. Sei lá, que dissessem que eu estava errado, que eu era um zé mané, que eu era um louco ou ao menos para dizer um "isso acontece". Em vez disso, o silêncio. Na primeira vez que eu fui assaltado, há doze anos, aconteceu algo parecido. Voltei para o lugar onde eu trabalhava na ocasião e fui pedir ajuda a um dos seguranças. O infeliz disse que não podia fazer nada. Chamei uma viatura da polícia e rondamos a região para ver se eu achava os meliantes adolescentes, mas sem sucesso, devo ter perdido tempo procurando ajuda no meu local de trabalho. Dessa vez, não fiz nada. Apenas fiquei curtindo a minha indgnação até que o ônibus chegasse. A cobradora e o motorista foram legais e me deixaram entrar sem pagar.
Acho que o problema todo nem é a violência urbana, mas é o fato de que você está sozinho lutando contra ela. Nenhuma viva alma procura te ajudar numa situação de risco, mesmo que numa distância segura. É a lei do cada um por si. É aquela sensação: "ainda bem que não foi comigo". Quando eu era moleque, minha avó me levava para brincar na Praça Princesa Isabel. É triste ver que hoje não se pode esperar um misero ónibus com tranquilidade. Se eu fosse o Afanásio Jazadi começaria aqui com um discurso anti-governo estadual, anti-polícia, mas quem tem um pouco mais de inteligência sabe que essas instituições fazem o que podem e não são apenas elas as responsáveis pela segurança do cidadão. O buraco é muito mais embaixo e ele passa pela educação, pela empregabilidade, etc. O que não pode é esse estado de letargia, com as pessoas se acostumando a assitir assaltos embaixo de seu nariz como se estivessem vendo um filme na televisão. Todos falam em mudança daqui, mudança dali, mas não basta mudar apenas trocar de presidente da República e a mentalidade continuar como esta. Vamos colocar a mão na consciência, pessoal.

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